sexta-feira, 6 de julho de 2012

Da rave ao camarote. Só faltam as cabines!


Muita água passou sob a ponte que liga as eras das raves clandestinas sobre o barro até o título de segunda melhor balada do mundo, ostentado pelo Grupo Green Valley¹ em 2012.
O tempo foi relativamente curto. Porém o crescimento, exponencial.

 Segundo a revista Forbes² em matéria recentemente publicada, o mercado de música eletrônica no Brasil hoje atinge os zeros dos bilhões.
São milhares de reais gastos a cada evento, com atrações e festas suntuosas, que geram centenas de empregos e outros milhares (por vezes, milhões) de reais em lucros.
Esta realidade se confronta com outras situações e dá origem a alguns paradoxos:

O que falta para termos nomes considerados vanguarda mundial na e-music nacional?
Por que temos um mercado bilionário e poucos nomes nacionais respeitados pela cena fora do Brasil? Como um mercado tão rico quanto ativo não se manifesta através das produções musicais nacionais? Por que não temos um movimento, estilo ou gênero de emusic genuinamente nacionais?

Todos os gêneros, estilos e modalidades de sonoridades sempre foram deglutidos pela musicalidade brasileira para dar origem a estéticas genuinamente nossas.  As mesmas sonoridades africanas que deram os fundamentos ao samba, posteriormente misturaram-se ao funk, rock e até hoje se manifestam conforme surgem novos estilos.

Certa vez perguntaram ao Chico Buarque sobre o que o mesmo havia sentido durante a primeira vez em que ouviu Beatles. Trocando sua resposta em miúdos, Chico disse que nossa bossa nova foi um tapa na cara do “roquezinho”  de 4 notas dos Beatles. Aquele rock simplório  significou para o Chico um retrocesso musical e nossos acordes dissonantes estavam anos-luz a frente do novo rock da época.

Nada pessoal contra os Beatles. Só concordo com o Chico quando ele diz que nós fomos muito mais criativos naquele período.

Porém existe uma razão que equaciona criatividade e tecnologia nos dias de hoje.
É praticamente impossível inventar algum solo novo de guitarra. Ou levada de baixo ou batera que já não tenha sido tentada. Partindo da premissa de que os elementos da música acústica tradicional já foram explorados à exaustão, as novas fronteiras da criatividade estão na incorporação de sonoridades manipuladas através de tecnologia.

E tecnologia no Brasil é coisa cara. Uma das mais caras no mundo, para ser realista.
Não teremos um movimento de talentos na música eletrônica brasileira enquanto um computador com capacidade mínima para produção for mais caro que uma motocicleta.
Na realidade onde a tecnologia é ferramenta básica para gerar criatividade musical a situação econômica conta e muito.

 Por conta dessa elitização da tecnologia o que temos são poucos exemplos de criatividade, nenhum movimento genuíno e baixa qualidade na média geral do que se escuta por aqui.
Pela mesma ponte que liga as raves aos camarotes passaram dois tipos de produtores.
Os primeiros nos anos 80-90, que sem muito conhecimento musical conseguiram produzir sonoridades novas apenas com feeling e tecnologias hoje arcaicas. Hoje o nível de expectativa técnica (mesmo do público leigo, que percebe um kick bom sem nem saber o que é um kick) em relação às produções musicais é maior.

 A vanguarda mundial hoje é ocupada por artistas que dominam tanto teorias musicais, quanto as ferramentas tecnológicas. São os novos músicos-produtores.
Santo Roger Waters! Amém, Kraftwerk!
James Blake, Nico Jaar.  Flying Lotus e todo o movimento cabeçudo do Neo-Hip-Hop de L.A.
São vários artistas dentro deste novo perfil de vanguarda. Nenhum brasileiro. Pelo menos por enquanto.

E agora?
Nos contentamos a ver somente o Gui Boratto ou o Marky representando o Brasil nos maiores festivais?
Ficamos satisfeitos quando vemos o Psilosamples³ tocando em alguma festinha por aqui?
Quando teremos um brasileiro no selo Warp 4? Ou quando teremos um selo brasileiro com a proposta de um Warp, com foco na criatividade? Mais além, quando teremos um mercado para absorver cultura musical de qualidade?
Quantos “sonares“ cabem na sua cidade? E quantos artistas brasileiros fariam parte do lineup sem comprometer a proposta do evento?

Ao meu ver essas respostas tocam em assuntos que são a base da construção de qualquer país desenvolvido. Aumento do nível cultural e melhor distribuição de renda.
Enquanto isso vamos continuar recebendo spams de produtores mequetrefes tentando emplacar uma versão mal feita de um hit do Guetta.

Uma coisa para mim é certa.
Um dia talvez façamos e-hits como Jones ou Guetta.
Mas nenhum dos dois jamais fará samba como a gente.
Fontes/Links

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